Há exatos 10 anos, rompia-se um silêncio.
Em 14 de julho de 2007, depois de alguns encontros, reuniões, partilhas e sonhos trocados, entrava no ar o nosso site, que deu vida ao Diversidade Católica, e iniciou os primeiros passos de um apostolado bonito e profético, em favor da cidadania LGBT na Igreja e na sociedade. Nascia o primeiro grupo de católicos LGBT do Brasil, com a missão de romper o silêncio e anunciar que a mensagem do Evangelho é uma mensagem de amor que pode e deve alcançar a todas as pessoas sem distinção, sem violência, sem exclusão.
De lá para cá, testemunhamos coisas que não imaginávamos que aconteceriam tão cedo, e louvamos a Deus em gratidão por isso. Vimos o Papa Bento XVI lembrar que o Catolicismo deve ser uma opção positiva, e não um mero conjunto de proibições. Vimos o Papa Francisco resgatar a força da mensagem do Cristianismo como uma opção que deve se pautar pela liberdade, pela acolhida e pelo diálogo fraterno, incentivando uma pastoral mais aberta à escuta e ao discernimento, longe da repetição cega de algumas de normas morais. Recebemos com alegria o seu alerta de que devemos ser facilitadores da Graça, e não agir como se fôssemos controladores dela. Lhe ouvimos dizer: “se uma pessoa é gay, e tem bom coração, e busca a Deus, quem sou eu para julgar?”. Lhe vimos receber, em sua residência, um homem trans que fora vítima de transfobia na paróquia que frequentava. Lhe vimos receber, em audiência, um grupo de católicos LGBT como o nosso. Gestos que foram um importante testemunho da abertura acolhida e amorosa que precisamos multiplicar na Igreja.
Vimos a Igreja brasileira também se manifestar, alertando que “muitos se afastaram e continuam se afastando de nossas comunidades porque se sentiram rejeitados, porque a primeira orientação que receberam fundamentava-se em proibições e não em uma proposta de viver a fé”. Testemunhamos, com alegria e esperança, o convite para que consigamos atender pastoralmente às novas configurações da vida familiar, a fim de não perder em nada o anúncio da Boa-Nova, e a fim de que ela seja sempre nova e sempre boa, sem se prender no atraso dos tempos que já se foram, e sem perder a potência de vida nova que o Evangelho pode sempre promover.
De lá para cá, vimos (e fomos) pessoas LGBT assumindo o protagonismo leigo convocado pelo Concílio Vaticano II. Propusemos debates e discussões, participamos ativamente da reflexão teológica e eclesial, e assumimos a missão profética de denunciar a injustiça e anunciar a Esperança para todas as pessoas. Vimos a nossa mensagem de inclusão e diversidade se espalhar por diversos outros grupos irmãos, que foram crescendo em todo o Brasil, até o dia em que fizemos nascer a nossa Rede Nacional de Grupos Católicos LGBT. Estivemos presentes no primeiro encontro mundial de católicos LGBT, que reuniu membros e grupos pastorais de todo o mundo, dando origem à Global Network of Rainbow Catholics, em outubro de 2015, em Roma. Construímos alianças bonitas e importantes com irmãos e irmãs de outras tradições religiosas, se unindo a um movimento de diálogo interreligioso em favor do respeito, da diversidade e da liberdade, que são valores do Evangelho.
Vimos o nosso grupo crescer, tendo acolhido muitas histórias durante todos esses anos. Em nossas reuniões e encontros, testemunhamos a doação e a honestidade da fé de tantas pessoas LGBT que mantiveram o seu amor a Deus e à Igreja, mesmo em meio a tantas dificuldades. Testemunhamos o seu carinho pelo Evangelho, e a sua dedicação à missão de anunciar a mensagem do amor de Deus uns aos outros. Tivemos o privilégio de conhecer estas histórias para além dos estereótipos que são espalhados sobre nós – da mesma forma que Deus nos conhece. Entre nós, muitas vidas foram alcançadas, tocadas e transformadas. Muitas pessoas experimentaram a profundidade do amor de Deus – um Deus que por vezes fora apresentado a elas como um senhor de ódio e condenação. Muitas feridas foram cuidadas e curadas. Muitas pessoas se reaproximaram de Deus. Algumas delas renovaram a sua esperança numa vida de que já tinham desistido. Muitos laços de amor e de afeto foram construídos e reconstruídos. Muitas famílias foram reconciliadas. E os sinais da ação do Espírito entre nós se multiplicam diariamente.
Neste dia, na celebração destes 10 anos, que é tão significativa pra nós, queremos agradecer a Deus pelos tantos passos que demos nessa caminhada, pela doação bonita dos nossos membros, parceiros e aliados, que sempre estiveram conosco, e principalmente por aqueles e aquelas a quem a nossa mensagem tem alcançado. Rezamos para que o nosso trabalho continue firme na construção do Reino de Deus, e que continue dando muitos frutos! Rogamos pela intercessão de São Camilo de Léllis, fundador da Ordem dos Ministros dos Enfermos, que tem seu dia celebrado hoje. Assim como ele tanto contribuiu para curar as feridas dos corpos, que nós também possamos seguir curando feridas em corpos e almas machucados pela LGBTfobia.
Que Maria nos cubra com o seu manto de amor, e que o seu carinho se estenda a todas as pessoas LGBT que ainda se encontram na escuridão da solidão, da violência e do ódio. Que ela nos ajude a continuar sendo veículo do amor de Deus a estas pessoas, pelos anos que ainda virão.
Vida longa ao Diversidade Católica!